DOSSIÊ: DUNGA
Dunga manteve por muitos anos um segredo bem guardado: a intermediação de transações em direitos econômicos de jogador de futebol. Quando foi questionado por esta reportagem sobre sua participação na venda do meia Ederson, em 2004, do RS Futebol Clube para o grupo Image Promotion Company (IPC), foi incisivo na negativa. Através da assessoria de imprensa da CBF, afirmou "não ter participação alguma na venda dos direitos sobre o vínculo do referido jogador".
Três documentos públicos, porém, mostram o contrário: uma nota fiscal da "Dunga Empreendimentos, Promoções e Marketing ltda", com a comissão no valor de R$ 407.384,08; o recibo assinado pelo próprio Carlos Caetano Bledorn Verri, o Dunga; e o comprovante bancário de transferência do clube para a empresa do treinador, no valor discriminado na nota. Não é o único conflito de interesse com o cargo de comandante da seleção brasileira nessa história: as ligações com os agentes do IPC vão muito além do que um único negócio.
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Em 14 de janeiro de 2004, o RS Futebol Clube negociou 75% dos direitos sobre o vínculo desportivo do meia Ederson, (Internacional, Juventude, Nice, Lyon e atualmente Lazio) com o grupo IPC, pela quantia de U$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil dólares). O IPC foi representado na negociação pelo empresário italiano Antônio Caliendo. A comissão do intermediário Dunga foi paga pelo clube gaúcho. Na nota emitida pela empresa "Dunga Empreendimentos, Promoções e Marketing ltda" está especificado o "faturamento de honorários profissionais pelos serviços prestados de assessoramento, acompanhamento e indicação de investidor na aquisição de direitos federativos e econômicos de atleta". A pedido do IPC, os direitos federativos foram repassados para o francês Nice, onde Ederson atuou por três temporadas.
No dia 8 de maio de 2006, os investidores do IPC fecharam a compra dos 25% restantes dos direitos que o RS Futebol Clube ainda tinha de Ederson pela quantia de U$ 575.000,00 (quinhentos e setenta e cinco mil dólares). Diferentemente da compra dos 75% anteriores negociados por Antonio Caliendo, Dunga já não consta mais como intermediário da transação e sim como o autor do depósito dos U$ 575.000,00, oriundo de uma agência do Credit Suisse em Mônaco, sede também do IPC e creditado para os responsáveis pelo RS Futebol Clube. Em processo judicial que corre na justiça gaúcha, Dunga nega que tenha sociedade na IPC, alegando que o depósito feito por ele foi um empréstimo para o IPC.
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Por trás do endereço do IPC, em Mônaco, estão mais revelações sobre as teias de relacionamento de Dunga. O investidor, para quem o treinador da seleção intermediou o atleta do RS Futebol Clube, encontra-se no mesmo endereço da World Champions Club (WCC), na Avenue Princesse Alice. A WWC é uma conhecida empresa de agenciamento no futebol. E entre os gestores está Antônio Caliendo, que representou o IPC na compra dos 75% de Ederson, onde Dunga ganhou comissão por intermediação. O meia não foi convocado pelo treinador em sua passagem anterior pelo comando da seleção, vindo a ser chamado em 26 de julho de 2010, primeira convocação de Mano Menezes, para o amistoso no dia 8 de agosto contra os Estados Unidos - quando ficou três minutos em campo e se lesionou.
A reportagem quis saber de Dunga se ele ainda tinha algum vínculo com a empresa. O treinador disse "não ter vínculo com a empresa em questão e que esta empresa o representou quando ele era jogador". Provavelmente não viu o site da WWC, onde é uma das estrelas e identificado como "um dos nossos últimos clientes", ao lado de Ederson e Maicon, convocado por Dunga para a Copa do Mundo de 2010. Não apenas isso: onde consta a relação e fotos dos futebolistas pelos quais respondem pela gestão, Dunga aparece em foto recente e não de quando era jogador.
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O inglês Queens Park Rangers também estrela o site. A WWC assumiu a gestão do QPR em 2004. Mesmo sem "ter vínculo com a empresa em questão", Dunga assumiu cargo no conselho de gestão do clube, formado por cinco membros. Por ser agente Fifa, Antonio Caliendo não podia figurar oficialmente entre tais conselheiros, e o técnico da seleção era seu rosto.
O segredo que Dunga trouxe bem guardado até esta quinta-feira atravessou incólume uma passagem de quatro anos à frente de uma seleção nacional. Tendo como base um discurso de comprometimento e amor pela camisa verde e amarela. Ao voltar esta semana, ressaltou a base moral que sustentava esse retorno: "Dificilmente uma pessoa muda em seus princípios, os meus são a ética, comprometimento, lealdade, transparência, trabalho". Ao lado do treinador, a comissão técnica tem Gilmar Rinaldi, que deixou de ser empresário de jogadores no dia em que assumiu o cargo de coordenador na seleção brasileira.
Lúcio de Castro, especial para o ESPN.com.br
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