No futebol brasileiro, as mulheres não têm motivo algum para comemorar. Seu dia será esquecido. Como são seus torneios clandestinos. Sem interesse da tevê, de patrocinadores, de público. Não há vontade de ver brasileiras chutando uma bola…
Marta no sorteio da Copa do Mundo, na Bahia.
Deslocada, desconfortável.
Enquanto centenas de jornalistas do mundo inteiro buscavam informações.
Lá ela estava à vontade, sem ser importunada.
Principalmente por repórteres brasileiros.
Isso apesar de Marta ser a mais talentosa jogadora de todo o mundo.
O motivo é tão simples como cruel.
O futebol feminino não desperta o menor interesse no Brasil.
Não pode ser considerado profissional.
Os clubes que insistem em existir pagam salários pífios.
Incomparável com o que os homens recebem.
Muito, mas muito menos.
Jogam em estádios acanhados, muitas vezes vazios.
A situação é de puro constrangimento, de penúria.
Muitas ganhando salário mínimo.
Neste e na grande maioria dos dias internacionais das mulheres é a mesma coisa.
Promessas mentirosas dos dirigentes, das autoridades.
Que serão criados torneios importantes, de grande visibilidade.
Com as tevês fazendo fila para mostrar.
Ano após ano é a mesma coisa e, no final, nada.
José Maria Marin passou vergonha diante de Joseph Blatter.
O presidente da Fifa fez um pedido público.
Que o Brasil não 'esquecesse de suas mulheres no futebol'.
Marin sorriu e prometeu que iria cuidar delas.
Mas logo se esqueceu da promessa.
O futebol feminino neste país é clandestino.
Disputa torneios que podem ser chamados de piratas.
Abandonados pela mídia, patrocinadores, torcedores.
E em um viés totalmente inverso do atual mundo feminino.
Não há a menor perspectiva de mudanças.
Mesmo com 2016 o Brasil sendo sede de uma olimpíada.
O planejamento é pífio, quase inexistente.
Marin já tentou repassar o problema para os grandes clubes brasileiros.
Mas eles já estão às voltas com mais de R$ 4,7 bilhões em dívidas.
O Santos foi o último a tentar.
Formou um esquadrão, com a maioria das atletas da Seleção Brasileira.
Inclusive Marta.
Ganhou inclusive Libertadores.
Mas o sonho durou uma temporada com tevê.
A falta de audiência e de patrocinadores logo matou o time.
E as jogadoras da Seleção foram para o Exterior cuidar da vida.
O atual campeão da Libertadores feminina é o São José.
O vice é o time colombiano chamado Formas Íntimas.
Mas 99,9% da população brasileira não tem a menor ideia.
As jogadoras tentam se defender.
Dizem que são injustiçadas.
Sofrem com o machismo do brasileiro.
"Estados Unidos e a Alemanha não conquistam tudo à toa.
Eles têm estrutura.
Nós passamos por muitas dificuldades.
E enfrentamos machismo e preconceito."
O desabafo é de Marta.
Ela já se cansou dessa situação que perdura desde 1983.
Foi o ano que o histórico Radar ganhou o primeiro brasileiro.
Embora tenho ganho vários torneios anônimos, o Radar ficou conhecido.
Era tão bom que representou até a Seleção Brasileira.
Sem apoio, o time foi minguando até morrer em 1989.
As mulheres no País ganham espaço em quase todos os seguimentos.
O futebol feminino é uma digna exceção.
Executivos da Globo nem pensam em perder tempo.
Sabem que a rejeição é enorme.
Assim como a Bandeirantes.
E os canais a cabo não se estimulam com mulheres jogando futebol.
Só transmitiriam o esporte se houvesse um grande patrocinador.
Mas eles não existem.
Grandes clubes masculinos do País não têm uma empresa master na sua camiseta.
Várias atletas da Seleção já choraram diante das câmeras.
Pediam apoio, campeonatos de verdade.
Mas perderam tempo.
A Fifa contabiliza 29 milhões de mulheres jogando futebol no mundo.
No Brasil são cerca de oito milhões que praticam o esporte.
Mas mesmo as que gostam de jogar não querem ver mulheres atuando.
Preferem os homens.
A situação se mostra constrangedora.
Mesmo o Brasil já tendo conquistado o vice na Copa do Mundo em 2007.
E o terceiro lugar em 1999.
Medalha de prata nas Olimpíadas de Atenas e de Pequim.
Sem um título importante, logo as meninas ficaram queimadas.
Acabaram taxadas de 'pipoqueiras', inseguras nas decisões.
A situação da mulher jogadora de futebol no país é caótica.
Ela é obrigada a ter uma outra profissão para sobreviver.
A fórmula do Brasileiro vai mudando de acordo com o ano.
É tudo amador, mambembe.
Com jogos e gols que muitas vezes nem os parentes das jogadoras assistem.
A proximidade da Olimpíada nos dois próximos anos podem disfarçar.
Qualquer migalha do governo federal e um olímpico competitivo poderá ser montado.
E com a obrigação de conquistar a medalha de ouro.
A intolerância e incompetência da Seleção Masculina chegarão triplicados na Feminina.
Estas são a marca da CBF.
Houve muita frustração coma eliminação do Brasil nas Olimpíadas de 2012.
O time caiu diante do Japão nas quartas.
Marin tratou internamente o resultado como um vexame, um caos.
Se esqueceu do Brasileiro pirata que organiza.
E que obriga as melhores do país a atuar fora.
Como Marta que está no Tyresö FF desde 2012.
A mulher moderna se destaca em várias áreas da vida brasileira.
Já é em maior número no trabalho e na escola.
Mas no futebol é sinônimo de clandestinidade.
Como dirigente, no entanto, jogou uma grande oportunidade fora.
Patricia Amorim foi presidente do clube mais popular do País.
Só que mostrou tanto despreparo quanto incompetência no Flamengo.
Levou até vícios da vida pública de vereadora para a Gávea.
Empregou parentes.
Levou funcionários do clube para seu gabinete político para ganharem dinheiro.
E trabalhar na Gávea.
Foi publicamente manipulada por homens de sua diretoria.
Um caos.
Sua eleição foi um retrocesso para a mulher como dirigente de futebol.
As brasileiras têm muito a se orgulhar hoje.
Menos no futebol.
O balanço é amplamente desfavorável.
Machismo, preconceito e pura rejeição do torcedor estão cada vez mais fortes.
De novo, mostra que a sua esperança no futuro não morre.
"Quem sabe as coisas não mudam se ganharmos uma medalha de ouro na Olimpíada?"
A sua insistência é louvável.
A melhor jogadora do mundo fica agoniada quando vem ao Brasil.
Não tolera ver a penúria dos torneios femininos por aqui.
Com toda a razão se revolta.
E muitas vezes prefere nem ver.
Marta não está sozinha.
Há milhões de homens que pagam para não ver futebol feminino.
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Perfil
Cosme Rímoli
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