Publicado em 15/02/2014 às 13h19
Como o Santos, aos poucos, o São Paulo se cansou de Ganso. E admite que errou ao gastar R$ 24 milhões com ele. O clube promete brigar na justiça para não ter mais 10% do jogador. Muricy quer outro meia. A Seleção o esqueceu. Ele não reage. Parece não ter alma de jogador de futebol…
"O Pirlo parece que não corre, mas corre. E depende da posição, o Pirlo joga mais atrás. Se o Ganso jogasse na frente da defesa, tudo bem. Mas ele joga mais adiantado. Na Europa, a marcação é muito forte nessa zona que o Paulo Henrique Ganso joga. Ou fica mais dinâmico, ou fica mais difícil.
(...)"Eu acho que o Ganso tem muito talento. Mas, para mim, anda um pouco devagar dentro do campo. E com esse ritmo, não vai dar na Europa."
Simples, curto, direto, sincero.
Foi assim que Seedorf se referiu ao agora camisa 10 do São Paulo.
Essa foi a sua opinião antes de sair do Brasil para treinar o Milan.
O conceito do holandês foi o resumo de quase dois anos de observação.
Seedorf não só acabou com a empolgação de Galvão Bueno no Sportv.
Mas resumiu o que empresários que negociam com a Europa pensam.
E sofrem desde que ele surgiu ao lado de Neymar no Santos em 2009.
São quase cinco anos de frustração ao tentar empurrá-lo ao Velho Continente.
Os agentes já tentaram mostrá-lo como novo Zidane, novo Pirlo.
Mas a ingenuidade não frequenta o futebol há dezenas de anos.
Os lances brilhantes apenas não seduzem mais.
Os compradores de equipes europeias passam meses nos países vendedores.
Ou sejam observam partidas e mais partidas de atletas importantes.
Vários já desperdiçaram seu tempo vendo Ganso.
A expectativa vira desperdício logo.
Ele é capaz de fazer um, dois lances interessantes, diferenciados.
E o restante do jogo passa como um zumbi, vagando pelo gramado.
Sem construir, sem combater, sem abrir espaço, sem infiltrar.
Dando a nítida impressão que a partida não lhe interessa.
Ganhar, perder, empatar não muda nada na sua vida.
Se curva diante de qualquer marcação individual.
Seu talento é sufocado.
Para desespero dos treinadores e dos torcedores do time que defende.
Passa a terrível sensação de um casamento falido.
Onde o marido acorda todo o dia esperançoso.
Desejando ardentemente que a esposa esteja diferente.
Mais animada, alegre, companheira.
Só que basta abrir os olhos e a sensação de frustração domina sua alma.
Ela está fria, fazendo as coisas sem emoção, como obrigação.
Fica a seu lado por ficar.
A dor gela os ossos, provoca vergonha silenciosa.
Incapaz de revelá-la ao melhor amigo.
A tristeza é sua.
E resignado, ele espera por outra e outra manhã.
Mas nada muda.
A comparação vale a cada partida de Paulo Henrique.
Os são paulinos passam exatamente pelo que passaram os santistas.
Têm a sensação de que um craque veste a sua camisa dez.
Mas parecem perseguir uma miragem.
Em lances raros ele mostra o dom que Deus lhe deu.
Mas não consegue ter sequência e logo volta a deixar seu time com um a menos.
Isso porque não enfrenta os melhores marcadores do mundo.
Não está disputando a Champions League, o Campeonato Italiano, Alemão, Inglês.
Nem o Brasileiro.
Fracassa no insignificante Campeonato Paulista.
Equipes de aluguéis, montadas nas férias dos jogadores conseguem pará-lo.
Ney Franco, Muricy, Mano Menezes e muito outro treinadores se desesperaram.
Fizeram de tudo para tentar despertá-lo.
Mostraram vídeos, conversaram sobre o futuro, a chance de ter uma carreira brilhante.
Ser milionário na Europa, disputar Copa do Mundo, fazer história.
Mas também gritaram, exigiram, foram duros, ameaçaram com a reserva eterna.
Não adiantou.
A reação foi a mesma.
Ganso promete que vai melhorar e logo acaba se acomodando em campo.
A sua origem foge à da maioria dos jogadores de futebol.
Ele não era pobre, arrimo de família, nada disso.
Nascido em Ananindeua no Pará, seu pai trabalhava na Petrobrás.
Garantiu à família uma vida tranquila para a pequena cidade.
O jovem Henrique era conhecido no bairro Cidade Nova II.
Pela timidez e pelo talento com a bola nos pés.
Jogava porque gostava, mas nunca foi fixação virar profissional.
Ele viveria o resto da vida feliz com sua vida pacata e estável.
Só que o talento o levou até Belém, jogar futebol de salão no Tuna Luso.
Mas logo seu potencial foi visto por Giovanni.
Diziam que havia um novo 'Messias' no Pará.
O ex-ídolo santista gostou do que viu.
Ganso foi pressionado pela família e pelo ex-jogador.
Tinha de atuar profissionalmente, ser milionário.
Pouco importava se estava na sua personalidade.
Foi viver sonhos de outras pessoas.
Giovanni o levou para a Vila Belmiro.
Avisou que, como ele, era muito bom com a bola, mas tímido.
Logo o grupo DIS se aproximou do jogador.
E houve um rompimento dramático envolvendo dinheiro.
Giovanni disse que os 7,5% dos direitos do atleta viraram 0,75%.
Se sentiu enganado, mas não quis brigar na justiça.
Magoado, abriu mão de qualquer percentual do meia.
Hoje nem se falam.
Ganso ficou com a fama de virar as costas ao seu descobridor.
O grupo DIS comemorava ter 45% dos direitos do atleta.
Enquanto preservava Neymar, o Santos tentou empurrar o meia para a Europa.
O jogador não se conformava com o tratamento diferenciado que recebia.
Sentia que seu grande parceiro era privilegiado com todo marketing.
E por causa de suas contusões não tinha tanto apoio.
Ele fez três operações delicadas nos joelhos.
Exames mais modernos do planeta foram feitos pelo São Paulo.
E ficou constatado que ele poderia jogar sem o menor problema.
O entrave era o trauma das divididas e até o medo de chutar que tinha.
Os fisioterapeutas, fisiologistas e médicos mostraram a ele que tudo estava bem.
E ele agora teria de justificar os R$ 24 milhões que o São Paulo gastou.
Para ter apenas 45% dos seus direitos.
O que era um motivo de orgulho para Juvenal logo virou preocupação.
Nada do meia se impor em campo, se assumir como grande jogador.
Ney Franco avisou o presidente que seu estilo lento não combinava.
Não com a velocidade de Jadson.
E preferia deixar o ex-santista de fora.
Esse foi um dos motivos de sua demissão.
Ganso teve todo o apoio de Paulo Autuori.
Mas não rendeu.
E agora Muricy se desespera para que seja o atleta que precisa.
Só que o grupo DIS já percebeu.
O sonho de faturar muito dinheiro com seu atleta já não existe.
E promete ir na Justiça receber R$ 5 milhões.
O motivo é constrangedor.
Quer obrigar o São Paulo a cumprir uma cláusula no contrato do atleta.
Ela já dava pista que que os empresários o querem repassar.
Se atuasse em 70% dos jogos em 2013, o clube compraria mais 10% dos seus direitos.
Pelas contas do grupo foram 79,5% dos jogos.
Mas o clube afirma que amistosos não contam.
E só partidas oficiais e elas somam 68%.
O DIS promete processar o São Paulo para ficar com mais uma parte do atleta.
Situação surreal e inacreditável para quem o viu surgir no Santos.
Enquanto isso, Muricy já pediu a Juvenal para trazer Wagner do Fluminense.
Precisa de um outro meia canhoto, habilidoso.
Não para servir de sombra.
Mas para ser titular do time.
O treinador está cansado de cobrar Paulo Henrique.
Juvenal demorou mas percebeu que a contratação está se mostrando um erro.
As palavras de Seedorf reverberam no Morumbi.
Dificultaram ainda mais a vida dos empresários que sonham em vender Ganso.
No CCT ontem na Barra Funda ele ouviu Muricy o cobrar publicamente.
Constrangido, tentou brincar com o treinador.
"Valeu, professor", deixou escapar.
Ele sabe o quanto sua passagem está decepcionante no Morumbi.
Seu nome deixou há muito tempo de ser cotado na Seleção.
Verá a Copa do Mundo das arquibancadas se quiser.
A sensação de todos que o cercam já passou da decepção.
É a mais pura frustração.
Parece que o menino tímido de Ananideua errou.
Estaria mais feliz trabalhando na Petrobrás.
E aos fins de semana daria seu show jogando pelada com amigos.
Só está claro.
Não deixaram o menino Henrique fazer o que queria.
O sonho de ser um grande craque mundial nunca foi seu.
Por isso tanta acomodação.
Está milionário mas infeliz.
Passa a sensação que está na profissão que não escolheu.
Por: Cosme Rímoli - r7.com
Ganhou o prêmio Aceesp por seis vezes, como melhor repórter esportivo entre jornais e revistas de São Paulo. Trabalhou 22 anos no Jornal da Tarde. Começou com o blog no UOL, em 2009. Em sete meses, teve mais de 11 milhões de acessos. Cobriu as últimas Cinco Copas do Mundo, seis Eliminatórias para a Copa, quatro Copas América, dezenas de finais de Libertadores, Brasileiros e Campeonatos Paulistas. Mundial de Clubes no Japão 2011. O Pan-Americano do México. Três etapas do UFC. Olimpíadas de Londres 2012. Copa das Confederações em 2013. Foi a 29 países cobrir eventos esportivos.
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